sexta-feira, 16 de maio de 2014

Uma sentença da Justiça Federal do Rio Janeiro achou por bem decidir que Umbanda e Candomblé não são religiões, por não possuírem textos sagrados escritos e não venerarem a uma única divindade (?). Em um Estado laico, não cabe ao Judiciário definir o que é religião - tudo aquilo que se reivindica como tal dever ser visto pela lei como religião, não importa a natureza do culto. Não cabe ao Juiz entrar no mérito de discussões teológicas. Aliás, se adentrarmos na discussão do mérito, podemos afirmar que neopentecostalismo não é religião, e sim comércio. Não verdade, são ambas as coisas. Quanto ao fato de Umbanda e Candomblé serem ou não religiões, remeto o eventual leitor ao texto da revista Carta Capital, que apresenta argumentos claros e inequívocos de que ambas as crenças são religiões e assim devem ser vistas pelo Estado. Como bem anotado pela Revista, a decisão mostra ao mesmo tempo ignorância, desrespeito e fundamentalismo. O Ministério Público recorreu, e esperamos que nas esferas superiores (STJ e STF) venham decisões mais coerentes.
http://www.cartacapital.com.br/sociedade/ha-ofensa-e-fundamentalismo-na-decisao-contraria-a-umbanda-e-ao-candomble-7480.html

domingo, 4 de maio de 2014

A falta de sensibilidade dos evangélicos fundamentalistas
Fundamentalista é aquele que crê de forma doentia na doutrina que segue. O termo é utilizado de forma mais destacada para o sectarismo religioso, e não por acaso nasceu no seio de subgrupos evangélicos extremistas, que ao final do século XIX opunham-se a toda forma de racionalismo que contestasse a ortodoxia cristã.
Se você, ao ler essas linhas, lembrar-se de alguma experiência desagradável que já passou em razão da postura dogmática de defensores do extremismo religioso, pode ter certeza de que está com a quase totalidade das pessoas de bom senso, a não ser que tenha optado por se isolar com o intuito de se ver livre da desagradável convivência com esses indivíduos.
É pesaroso, mas eventos como o Iluminismo, a Revolução Burguesa, a difusão tanto do liberalismo como do marxismo, o advento da laicidade estatal, a abertura da Igreja Católica e outras instituições religiosas para uma espiritualidade mais racionalizada, e mesmo a vulgarização da Ciência não conseguiram fazer vencer a razão e eliminar do Ocidente o dogmatismo religioso tacanho, intolerante e anti-progressista. Ao contrário, o que vemos hoje é uma ascensão desse dogmatismo, a ponto de ameaçar conquistas históricas, como a igualdade de direito das mulheres, a liberdade religiosa e o Estado laico. Restrinjo-me ao Ocidente porque no lado oriental do planeta o laicismo é minoritário.
No Brasil, o pensamento fundamentalista é mais bem representado pelas igrejas neopentecostais do que por qualquer outro segmento, embora também se encontre no catolicismo ou outros grupos menores. Entre os novos reformados, contudo, é que se veem de forma mais acentuada todas as principais características desse movimento: o fanatismo, a intolerância, a inconveniência, a falta de ética, o desrespeito com espaço estatal.
Citar a péssima conduta dos líderes dessas igrejas é importante, mas penso que este curto texto não acrescentaria muito às boas análises de vários pensadores sobre tal questão. Pretendo aqui caminhar por outro viés, destacar o outro lado da mesma moeda: a postura de grande parte dos adeptos dessas religiões, os frequentadores que não possuem função sacerdotal, em relação àqueles que não se aliam a sua facção.
Os fundamentalistas, em especial os adeptos do neopentecostalismo, doutrinados ao extremo como são - o que não os exime de responsabilidade pelos seus atos de sectarismo, que por vezes chega ao vandalismo - veem-se obrigados a aproveitarem toda oportunidade que lhes surge para encaixar sua ladainha religiosa, mesmo sob o risco de serem inconvenientes ou ofensivos.  Essas ocasiões surgem, em geral, quando o alvo de sua pregação está em um momento de fragilidade psicológica, seja por problemas financeiros, de saúde, familiares ou quaisquer outros que provoquem instabilidade emocional.
O recurso utilizado é se aproveitar de tais situações com um discurso que atribui culpa ao indivíduo pelo mau momento que atravessa. Isso induz a vítima – e coloco essa palavra de forma calculada – a imaginar que se abandonar antigas convicções, sejam quais forem, e aderir ao séquito evangélico, seus problemas desaparecerão com em um passe mágica. Se for uma pessoa de espírito fraco, mais um cordeiro se associa ao rebanho do pastor.
Na perversa lógica dos chamados crentes, todo aquele que não se enquadra no movimento cristão está em erro, vive no pecado, e atrai para si e aos membros de sua família toda sorte de infortúnios. É como se deus, assim como na lenda bíblica de Jó, descarregasse sua metralhadora de desgraças, não para testar a fé, mas para trazer o pobre coitado para a crença. É obrigação, para os fieis dessa linha, arrancar essas pessoas da perdição e trazê-las para uma pretensa salvação – como se de outra coisa além da ignorância, defeito esse que eles possuem em mais alto grau - o ser humano devesse ser salvo. Nesses diálogos mais do que impertinentes, que muitas vezes se iniciam com um aceno de preocupação pelos maus momentos em que passa seu interlocutor e finalizam com a doutrinação, que desde o início era o real objetivo do religioso, desaparece qualquer respeito em relação à condição emocional do outro. Por essa ótica enviesada e insensível, não há problema algum em ser agressivo, ferir convicções íntimas, magoar ou ser irritante ou inconveniente: o importante é arrebanhar mais um prosélito.
Os dogmáticos cristãos, com destaque para os neopentecostais, não compreendem como alguém pode descrer de seu deus sanguinário, não tenha seu profeta como o deus encarnado ou mesmo como melhor que outros que se destacaram na tradição religiosa, duvide das recompensas eternas e seu entediante céu ou das penas irremissíveis com seu absurdo (e inexistente) inferno, siga outra forma de espiritualidade e, pior de tudo, conteste a autoridade moral de seus $antos líderes. Esses livres pensadores, contudo, existem, não se convencem pela tática do medo e não desejam ser convertidos a porcaria nenhuma.
Nos últimos dias, fui alvo da investida de um iludido acrítico, outrora um amigo, hoje um quase estranho cuja distância prefiro manter. É impressionante, a meu ver, que um cientista social diplomado em uma conceituada Universidade Pública se considere “eleito” por crer em dogmas absurdos, e queira arrastar mais pessoas para suas crenças infantis. Creio ser importante mencionar que sua vida não está a mil maravilhas: ele passa por sérios problemas familiares, mas não culpo suas convicções religiosas por isso, pois poderia acontecer a qualquer um – inclusive aos neopentecostelhos.
Para ele e para todos aqueles que se unem ao seu ideal, faço um apelo: não insistam comigo. Não sei aonde minha forma de pensar me levará, mas sei que caminho não quero seguir. Assim como não tenho direito de violentar vossas consciências, eximam-se de tentar fazê-lo comigo.

domingo, 27 de janeiro de 2013

A TRAGÉDIA DE SANTA MARIA

Como os caros leitores do blog podem deduzir, não se trata de umaa resenha sobre o livro homônimo do espírito Adolfo Bezerra de Menezes, psicografado por Yvonne A. Pereira (recomendo a leitura). Trata-se de alguns breves comentários sobre o acidente na boate Kiss, em Santa Maria/RS, que vitimou mais de 230 pessoas. Aqui destacarei apenas algumas impressões retiradas das redes sociais. Estou enojado com as posições de algumas pessoas que se utilizam de argumentos religiosos para lançarem condenações absurdas sobre as vítimas.
No Espiritismo conhecemos os conceitos de causa e efeito, assim como de resgate coletivo, muito abordados na literatura espírita. Entretanto, o resgate de cada um pode se dar em qualquer lugar. O que aconteceu na Boate Kiss em Santa Maria/RS poderia perfeitamente ter ocorrido em um templo religioso. De acordo com a doutrina espírita, portanto, o acidente teve um propósito cármico, mas não é porque aconteceu dentro de uma boate que podemos imaginar que as pessoas foram punidas por frequentar um espaço de festas. Isso é de um moralismo absurdo e tacanho.
É triste verificar que muitos daqueles que se dizem cristãos vêem nisso uma punição divina aos moldes do mito bíblico de Sodoma e Gomorra.

domingo, 24 de abril de 2011

As mesas girantes


Em meados do século XIX um fenômeno de causa até então inexplicada tomou conta da Europa: as chamadas “mesas girantes”. De uma hora para outra, objetos inanimados, principalmente mesas, pareciam ter desenvolvido vontade própria e lançaram-se a “dançar” na presença de espectadores estarrecidos. A futilidade humana logo passou a ocupar-se desse fenômeno como um divertimento, exibindo-o em salões e teatros, mediante cobrança de ingressos ou de forma gratuita; porém, à exceção dos costumeiros mistificadores, ninguém possuía controle sobre os eventos, que ocorriam à revelia das vontades individuais dos espectadores, embora muitas vezes as mesas obedecesse a comandos de algumas pessoas.
A princípio alheio a essa moda, o pedagogo francês  Hippolyte Léon Denizard Rivail, por sugestão de seu amigo Fortier, lançou-se ao estudo da questão. O erudito professor nunca se interessou por modismos, mas o interesse de Fortier, a quem respeitava muito, fê-lo perceber que havia algo digno de ser investigado naquelas manifestações. O que ele não poderia imaginar era que suas pesquisas transformariam de forma radical sua vida e legariam ao mundo um conhecimento de proporções transformadoras: a doutrina espírita.
Rivail era cético com relação à idéia de que os fenômenos pudessem ter origem sobrenatural, mas suas pesquisas rapidamente o convenceram de que as mesas obedeciam a um comando inteligente, apartado das pessoas que assistiam ao espetáculo. O movimento das mesas não era aleatório, porém não obedecia a qualquer lei física conhecida. Como bom racionalista, Rivail sabia que “todo efeito inteligente deve ter uma causa inteligente” (palavras textuais do pesquisador). Dessa forma, o ilustre pedagogo descartou, uma a uma, com boa argumentação e lógica, todas as teorias que supunham tratar-se o fenômeno de charlatanismo, obra satânica ou consequências de distúrbios eletromagnéticos (embora a eletricidade e o magnetismo interajam nesses eventos). A verdadeira explicação não tardou: os provocadores dos fenômenos eram inteligências desmaterializadas – os espíritos.
Rivail descobriu que era possível se comunicar com essas inteligências, e criou um método para tanto, baseado em leves pancadas nos objetos. A cada pergunta do professor, os Espíritos respondiam com um determinado número de toques. A partir de então, o prof. Rivail passou a uma série de perquirições a essas inteligências, e em 1857 lançou ao mundo, sob o pseudônimo de Allan Kardec, a primeira versão de “O livro dos Espíritos”, base fundamental do Espiritismo. Em outros textos teremos a oportunidade de esmiuçar os princípios da doutrina espírita; com relação ao assunto ora tratado, é interessante saber que Rivail não ficou isolado em suas idéias; vários outros pesquisadores passaram a analisar os fenômenos espíritas, em toda a sua diversidade, como os físicos William Crookes, Oliver Lodge e Michael Faraday, os astrônomos Camille Flammarion e Friedrich Zöllner, o naturalista Alfred Russel Wallace, o criminologista Cesare Lombroso, o fisiologista Charles Richet, os estudiosos Ernesto Bozzano e Gabriel Delanne e o filósofo Leon Denis. Todos esses pesquisadores elaboraram especulações próprias  a partir de suas pesquisas, com maior ou menor divergência entre si, mas em comum chegaram à mesma conclusão: os fenômenos espíritas eram autênticos.
Referências bibliográficas:
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos.
KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns.
DELANNE, Gabriel. O Fenômeno Espírita.
WANTUL, Zeus, As Mesas Girantes e o Espiritismo.